A fome e o cansaço daquele dia bastante pesado nos fizeram
optar por não andar muito, nem procurar algum restaurante. Perto do hotel tinha
uma praça, e lá alguns pit dogs, o que já era mais que suficiente. Enquanto
andávamos, pude observar com mais atenção, reparar nos detalhes da
arquitetura, nas pessoas, no clima harmônico daquele lugar. Exceto pelo
multidão que transitava nas ruazinhas apertadas, a grande maioria com cara de
turista, aquele ambiente me pareceu bem interiorano, trazendo uma certa paz de
espírito.
Perdido nas
minhas observações e trocando algumas palavras com Clarice, segui o caminho até
o centro da praça, onde se concentravam as lanchonetes. Sentamos logo na
primeira, o que não fazia diferença nenhuma. Pegamos o cardápio, logo o garçom
se prontificou a anotar nossos pedidos. Rapidamente escolhemos a comida e
despachamos o rapaz para outra mesa.
- E aí, achando tudo muito estranho né? – Disse ela ajeitando
o cabelo atrás da orelha.
- Ué, não muito. Lógico que não esperava que isso fosse
acontecer, mas...sei lá.
- Eu nunca esperava isso. Na verdade não esperava nada do que
aconteceu. Só queria me divertir, sabe? Matar a saudade. E agora tá tudo tão
diferente assim.
- É, tá mesmo. Nunca achei que conheceria alguém na viagem,
muito menos que ia dividir o quarto. Mas tô até animado, acho que vai ser
melhor.
- Acha mesmo? Tive a impressão que você se arrependeu. Sei
lá.
- Não, de jeito nenhum. Quando decidi vir pra cá não pensei
muito bem sobre nada, sabe? Só vim, sem mais. Decidi ficar à mercê do acaso.
- Viu no que deu? Foi confiar no acaso...Acabou com uma
estranha dormindo no seu quarto. – Falou sorrindo, como se soubesse o quão bem
ela estava me fazendo.
- É. – sorri junto – Pela primeira vez o acaso resolveu ser
meu amigo.
- Seu amigo, porque? – Perguntou ela curiosa no que eu iria
responder. Quando fiz a pergunta não tive consciência do que podia representar.
Deixei escapar os meus sentimentos, agora teria que concertar as coisas.
- Porque viajar sozinho seria ruim. Ele me trouxe companhia,
ué! – Tentei camuflar, acho que sem sucesso.
- Hum, tá. E...
- Licença, pessoal. Os sanduíches. – Interrompeu o garçom, se
colocando entre eu e Clarice para chegar à mesa com nossos pedidos. – Qualquer
coisa só chamar, tá?
- Beleza. – Respondi.
Quase não conversamos enquanto
comíamos. O assunto que antes prometia encontrar rumos perigosos à minha
intenção de esconder o que eu sentia foi deixado de lado e agora se resumia
apenas em opiniões sobre a qualidade da comida. Melhor assim. Depois de comer,
deixamos a lanchonete e caminhamos de volta ao hotel. Durante o percurso nos
dedicamos apenas a planejar o dia seguinte, e mais uma vez aquela interrupção
passou despercebida em nosso assuntos.
Chegamos ao hotel. À medida que aproximávamos
do quarto eu ficava mais nervoso, não tinha como adiar. A porta trancada à
minha frente e alguns passos eram as únicas coisas que me separavam de deitar
com ela. Minhas mãos suavam frio, meu coração batia tão forte que desconfio que
ela escutava cada pulsação. Eu não estava preparado, tinha medo da minha
reação. Tentava não transparecer nada disso, mas estava cada vez mais difícil.
Entramos, Clarice foi para o banheiro
trocar de roupa e eu me deitei. A cena dela saindo do banho voltou a minha cabeça,
trazendo um misto de medo e excitação. Não tinha o que fazer, era enfrentar a
situação, apenas. Ela saiu vestindo um pijama listrado, com linhas rosas que
estampavam o fundo branco. O short era curto, revelando as coxas bem torneadas
que ela escondia sob as calças jeans. Enquanto eu a mirava de cima a baixo, ela
colocou a mochila na poltrona onde eu tinha dormido a tarde e, bem lentamente,
veio caminhando em minha direção, ou melhor, na direção da cama.
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