...Permaneci
algum tempo imóvel, assustado, tentando acreditar na chance que aparecia para
mim . Estava cansado desse medo que sempre me impedia de fazer as coisas. queria
me livrar de vez daquele maldito frio na barriga. Decidi não ensaiar nada,
apenas chegaria lá, simples. Coloquei o
livro dentro da mochila, me levantei e fui. No corredor evitava os pensamentos,
queria apenas acabar aquela caminhada até o banco da frente, que aliás, parecia
não chegar nunca.
Ao fim do trajeto me coloquei ao lado
da poltrona, olhei para ela rapidamente e sentei. Não falei nada, abri a
mochila e peguei de novo o livro. Não ia ler, como já sabem o balançar do
ônibus me impossibilitava isso, a intenção era parecer indiferente com a
mudança e evitar que ela falasse comigo. Não adiantou muito, quando ela
percebeu que a pessoa sentada ao lado não lhe empurrava contra a janela, olhou
surpresa para o lado e disse:
-Ué, cadê a senhora que estava
sentada aqui?
- Não sei- respondi. – Ela tinha
sentado no meu lugar. Tudo bem eu sentar aqui?
-Ah, claro ué. – Virou para o lado e
fechou os olhos. Em poucos instantes a velha chegou. Olhou para mim com uma
cara indignada e reclamou:
-Ô moleque, o que é que você está
fazendo aí? Sai logo que eu quero sentar.
-Desculpa, senhora, mas essa poltrona
é minha. A senhora se enganou quando entrou no ônibus.
-Mas você já viajou até aqui lá
atrás, para quê vir para cá agora?
- Porque comprei a passagem para
sentar aqui, quero viajar aqui.
-Esses meninos de hoje são todos
assim, desrespeitosos. Um dia vai ser velho e vai ver como é bom ser
maltratado. Moleque sem educação! – Saiu ela resmungando. Para minha surpresa a
menina ao meu lado estava atenta à discussão. Quando a velha saiu ela disse:
-Ela tem razão. Porque você quis vir
pra cá agora?
-Estava frio lá atrás. – menti.
-Ah! - tornou a fechar os olhos, e se
virou. Não sei se era apenas o que eu queria entender, mas ela pareceu um pouco
frustrada com a minha resposta, como se esperasse ouvir outra coisa. Meti os
olhos no livro, sem deixar de observá-la.
Já se passava algum tempo que eu
estava ali e ela permanecia imóvel, como esteve durante toda a viagem.
Aparentemente a minha presença ali não importava mais ou menos para ela do que
a gorda, continuava indiferente. Olhei para ela mais atentamente, sem medo que
ela me flagrasse e então percebi que ela
dormia. Abri um sorriso, e voltei aos meus pensamentos. Algum tempo
depois sentia que ela se aproximava de mim, bem lentamente. Senti sua cabeça
encostar no meu ombro, os cabelos loiros dela tocaram meu pescoço, fazendo
cócegas. Meu corpo estremeceu, fiquei sem ar.
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