Nem a escuridão total e nem o mórbido silêncio que inundavam
o quarto me faziam dormir. Nenhuma outra condição natural seria capaz de me
adormecer, talvez um sedativo muito forte. Meu estado de espírito não me
deixaria apagar, queria curtir aquele momento o máximo possível, mesmo sabendo
que ele ainda se repetiria algumas vezes. Poderiam ser quatro, cinco, mil
noites ao lado dela, não importava, seria pouco.
Totalmente
paralisado na cama, eu apenas a observava. Encontrei uma posição que me
permitisse obter a visão de cada pedacinho do corpo de Clarice. Limitei meus
movimentos para que não a incomodasse, não queria por nada no mundo perturbar o
descanso daquela linda criatura. Apenas meus olhos giravam calmamente em sua
órbita, capturando e processando cada visão obtida.
Ela dormia com
um braço debaixo do travesseiro e a perna direita levantada, formando um ângulo
agudo entre a panturrilha e a coxa. O short do pijama que já era curto, agora
deixava as pernas ainda mais à mostra, por conta da posição. Os músculos se
exibiam de maneira tão exuberante que me dava a impressão que eles sabiam
exatamente o efeitos que tinham sobre seus admiradores. Era como o canto das
sereias: de tão belo enfeitiçava e enlouquecia mortalmente os homens de boa fé.
Eu estava
ali, completamente submerso e entregue ao feitiço. Não queria por nada no mundo
ser despertado, mesmo sabendo que aquilo poderia se encaminhar para um perigoso
futuro, assim como nas lendas. Queria tocá-la. Sentir suas coxas, provar da
maciez e delicadeza que estavam ali diante dos meus olhos. Alguns centímetros
separavam minha mão das pernas dela, mas era perigoso. Poderia despertar
Clarice do seu sono. Ainda mais, podia assustá-la e fazer com que toda
confiança que tinha em mim desaparecesse. Poderia ser o fim de uma história que
ainda nem tinha começado e eu nem sabia se iria começar. Era perigoso demais.
Desviei meu olhar para um ponto do seu corpo que não pudesse oferecer uma
atração física muita forte e me contive.
A ideia de procurar outros pontos
para admirar funcionou como um tiro saindo pela culatra. Tudo nela era lindo,
digno de profunda admiração. Os olhos fechados com suavidade, os ombros que
saltavam ao pijama de alças, os cabelos ligeiramente desordenados, repousando
sob o travesseiro. A cena dela dormindo me trazia num jato descontrolado
excitação e ternura. Além de estar completado seduzido, eu estava apaixonado.
Sim, apaixonado. Naquele momento tive consciência disso, não fazia questão de
me enganar mais. Uma menina que eu conhecia a pouco mais de 48 horas era
completamente dona de mim.
Meu fascínio por aquela cena só ia aumentando com
o aprofundar da madrugada. Não tinha a mínima noção de quanto tempo já tinha
passado admirando-a e pensando naquela situação. Sabia que não poderia ser
pouco porque a minha posição já se tornara incômoda e um vestígio de sono pairava
sobre mim. Decidi então buscar o sono e interromper temporariamente meus
devaneios. Dei mais uma última olhada para ela. Uma mecha de cabelo havia
escorregado e encobria seu rosto. Com a máxima leveza possível, ajeitei-a para
trás da orelha, e lancei um beijo em sua direção. Procurei meu travesseiro e
fechei meus olhos.
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